Sétimo dia.
--- Ele vem?
--- Não sei. Quando falei com ele, ele disse que viria. Mas nunca se sabe.
Peter olhou o relógio novamente. Estava fazendo isso á cada cinco minutos, e parecia que os ponteiros não se moviam.
--- Vou ligar pra ele --- disse Luigi, cruzando as portas da igreja com passos rápidos.
Já fazia uma semana desde que Seth partira. Suspeitando que Will não estava com a cabeça no lugar, Peter pediu para rezar uma missa em memória de Seth. Havia ligado para Will, aparecera em sua casa, mas não conseguira ter certeza de que ele iria comparecer.
Sentiu alguem se aproximando, e virou-se. Arthur e Colin tomaram seus lugares ao lado de Peter. Mick estava ao lado deles, e mandou um beijo para Peter quando o viu.
--- Ele vem? --- Arthur perguntou, procurando Will pela igreja.
--- Luigi está ligando para ele agora mesmo.
--- Já era para ele estar aqui, não acha?
--- Dê um tempo a ele. As proximas semanas não vão ser as mais fáceis.
Arthur concordou silenciosamente.
Minutos depois, Luigi voltara. Não estava com a cara muito boa.
--- E então?
--- Ele disse que gostaria de vir, mas ainda não quer sair de casa.
Mick revirou os olhos.
--- Quanto mais cedo ele encarar a perda, mais cedo ele a supera --- disse ele.
--- Foi o que eu disse pra ele --- respondeu Luigi, baixinho.
--- E o que ele respondeu? --- perguntou Colin, falando pela primeira vez desde que chegara.
--- " Mande um Oi pros meninos " e desligou.
Os cinco se entreolharam, mas não disseram mais nada.
Minutos depois, o pastor tomou seu lugar diante em frente ao altar e começou o ritual cristão.
Will revirava os armarios em busca de outro pacote de biscoitos. Sua alimentação estava se baseando nisso: biscoitos, saldadinhos, tudo que fosse vendido dentro de pacotes.
Achou uma embalagem fechada de um biscoito e levou-o para cama. Não se importou que os farelos sujassem os lençóis. Tanto fazia para ele agora. Estava cansado até mesmo para reclamar de algo.
Enquanto comia, refazia mentalmente sua conversa com Luigi minutos antes.
--- E aí rapaz, já está a caminho?
--- À caminho da onde?
Luigi ficou momentaneamente calado.
--- Aah sim, claro. Não, eu... Eu não vou, Lui, desculpe.
Luigi suspirou fundo.
--- Acho que você devia vir. Sair um pouco de casa. Os garotos estão com saudades.
--- Tambem sinto saudades... Luigi, de verdade, eu não posso ir.
--- Não pode ou não quer?
Will pensou durante uns segundos.
--- Os dois, eu acho. Não é fácil sabia? Não é tão simples como...
--- Will, pare com isso. Nós dois sabemos o que está acontecendo. Você está evitando o problema.
--- Ele morreu, Luigi --- sua vóz estava vazia --- Ele não vai voltar.
Luigi suspirou fundo. Estava tentando ser compreensivo. Mas nos ultimos sete dias, Will praticamente evitara todo mundo. Raramente atendia as ligações. Quando abria a porta, olhava por uma fresta minuscula.
--- Lui, eu... Eu ainda não posso, tá legal? Quando eu estiver pronto...
--- Will, quanto mais cedo você escarar a perda, mais cedo você supera.
Will riu sem humor algum. Ele nunca vai entender. O amor dele está lá, vivo. O meu apodrece de baixo da terra.
--- Mande um Oi pros meninos. --- Will desligou antes que Luigi pudesse responder.
Quando chegou em casa, logo no final da tarde, Peter pegou o telefone.
--- Vou ligar pra ele. Ver como ele está.
Luigi concordou com a cabeça e abriu a geladeira. Estava faminto.
Primeiro toque.
Segundo toque.
Terceiro toque.
...
Décimo segundo toque.
Peter desligou o telefone, impaciente.
--- Ele não atende! Deve saber que sou eu.
Luigi havia acabado de fazer um sanduiche de presunto e queijo, com algumas folhas de alface.
--- Peet, relaxa. Ele deve estar dormindo. Não tá sendo fácil pra ele.
--- E ele vai ficar nisso até quando? Ele não tem emprego, obrigações. Uma hora os pacotes de bolacha vão acabar. E aí? Ele morre de fome?
Luigi deu uma dentada no sanduiche.
--- Ele tem o ritmo dele --- disse, tapando a boca com a mão enquanto mastigava a comida --- Quando ele se sentir pronto, ele vai voltar ao normal.
Peter cruzou os braços, impaciente.
Luigi percebera que Peter estava preocupado. Preocupado demais.
Ele levantou e abraçou Peter pela cintura.
--- Te conheço, garoto. Você está preocupado com outra coisa.
Peter suspirou fundo.
--- Lembra quando ele nos contou que estava indo naquelas festas onde soropositivos faziam sexo sem camisinha?
Luigi entendeu onde Peter queria chegar.
--- Você tem medo que ele volte a frequentar tais festas. --- disse, afimamente.
--- Pense. Ele está sózinho. Deve estar carente. Vai que da uma louca na cabeça dele e ele resolve afogar as magoas com um portador de HIV. Não é algo tão absurdo assim.
--- Amor, ele é inteligente o suficiente para não fazer isso de novo.
Peter olhou firme para Luigi, demonstrando não acreditar naquilo.
--- Uma semana. Se daqui uma semana ele não sair dessa, eu vou até lá.
--- Duas semanas, que tal?
Peter balançou a cabeça, negando a sugestão.
--- Uma semana está bom demais.
Uma semana é tempo demais, pensou Peter, sentado em seu escritório. Fazia três dias que ele decidira dar um tempo á Will, mas não estava dando certo. Quase sempre o pensamento de Will colocando em risco á propria saude o atormentava.
Sem cerimonia alguma, Christopher entrou na sua sala.
--- Hei, Peter. E aí?
Peter deu os ombros.
--- Na mesma.
Christopher sentou na cadeira vazia, em frente á mesa.
--- Não foi até a casa dele por que?
--- Decidi dar um tempo pra ele. Mas estou quase indo lá ainda hoje.
--- Não sei... Nunca conversei muito com Will, mas das poucas vezes que o vi, ele sempre me pareceu meio distante de tudo. Como se... Não estivesse ligado nas coisas ao redor dele.
Peter riu sem humor algum.
--- Quando Seth o deixou, ele ficou em estado de torpor. Ele aguentou a situação por quase dois anos. Mas agora que Seth se foi... Quanto tempo ele aguenta?
Christopher deu os ombros, sem saber responder.
O telefone da mesa de Peter tocou. Ele atendeu, e ficou escutando. Por fim, colocou o telefone no gancho e olhou para Christopher.
--- Diga que está brincando. Por favor.
Christopher franziu a testa.
--- Do que você tá falando?
Peter respirou fundo. Disse pausadamente.
--- Estagiário. Proxima semana. Comigo.
--- É mesmo, quase havia me esquecido --- disse ele, entregando um portfólio de capa azul para Peter --- Matt Van Harden. Parece ser bom. Está na mesma universidade que você estudou.
Peter franziu a testa.
--- " Van Harden " ?
--- Exato. Familia tradicional. A mãe é uma atriz de teatro, e o pai é diretor de cinema.
--- Que filme que ele dirigiu?
Christopher deu uma risadinha maliciosa.
--- Alguns filmes meio... Alternativos.
--- Alternativos... ? Tipo Amelie Poulain?
--- Haha, quem dera. Não, alternativos tipo... Sem figurino algum.
Peter arregalou os olhos.
--- Filmes pornos? Tá de brincadeira comigo!
Christopher riu com vontade diante da cara de espanto de Peter.
--- É sério. Dei uma pesquisada na internet, o pai de Matt é bem conhecido nesse meio de filmes eróticos. Já viu " Enfia até o talo! " ?
Peter estremeceu com o título da obra prima.
--- Christopher, é informação demais pra um dia só.
Christopher riu como uma criança que foi pega fazendo coisa errada.
--- Mas o que interessa é: Me ligaram na universidade perguntando se nós queríamos um estagiário. Ele conseguiu uma vaga pra estudar na Europa, mas o pai não deixou-o ir.
--- Então quiseram jogar ele aqui, e você aceitou?
--- Isso. Estive olhando o quadro de funcionarios da empresa... O ultimo estagiário foi a mais de um ano.
Peter se lembrava disso. Samara. Cabelos rebeldes, cor de chocolate. Era uma boa designer, mas moderna demais para a ArtDeco. Peter se lembrava de um projeto dela: Uma sala de jantar, onde globos de luz usados em casas noturnas, ficava pendurado no teto da sala. Terrivel.
Peter começou a folhear o portfólio. O garoto realmente tinha talento pra coisa. No fim do portfólio estava anexado o contrato de seis meses de estágio remunerado.
Peter procurou pelo campo que o interessava. E achou.
" Nome do tutor responsável pelo estagiário:
Peter Callendon DeWitt "
--- Legal --- disse ele, sarcastico --- Seis meses com um estagiário me seguindo pra todo lado. Por que você não jogou ele pro Charles? Ele adora tratar os estagiário como escravos. Sei por experiencia própria.
--- Você também estagiou aqui?
--- Sim. Um ano de estágio. Depois fui efetivado. Aprendi a usar a maquina de café por causa do Charles.
Peter deu os ombros e guardou o portfólio em uma gaveta.
--- Certo. Eu fico responsável por ele. Quando ele vem?
--- Daqui á duas semanas.
--- Que maravilha.
Christopher se levantou e arrumou o paletó.
--- Okay, nos falamos depois. Tenho que resolver umas coisas.
--- Certo.
Antes de chegar a porta, Christopher se virou e disse:
--- Você quer companhia pra ir até a casa do Will?
Peter deu os ombros.
--- Pode ser... Você está livre agora?
Christopher pensou por um segundo.
--- Me dê 20 minutos. Eu venho até aqui e nós vamos.
Peter balançou a cabeça e sorriu.
--- Sim senhor.
Christopher sorriu e saiu da sala.
--- Pode parar aqui. A casa dele é essa de dois andares.
Christopher olhou para o apartamento que era um duplex. Bonitinho, até.
Eles saíram do carro e subiram os três degraus que os levavam até a porta de carvalho marrom.
Peter deu três toques na porta e esperou.
E esperou.
Esperou mais um pouco.
Christopherolhou para o relógio. Dez para as sete da noite.
--- Ele não pode estar dormindo --- disse Peter, mau-humorado.
Quando estendeu a mão para tocar a porta novamente, a mesma se abriu um pouco. O suficiente para Peter ver Will.
--- Will! Nossa, o que está... Quer dizer, tá tudo bem aí?
Will estava com cara de cansado. E estranhamente, ele estava com um lençol branco preso na cintura, e sem camisa.
--- Hã, oi Peter. Oi... Desculpa, esqueci seu nome.
Christopher sorriu educadamente.
--- Sem problemas.
Will olhou pra Peter, que estava com as sobrancelhas abaixadas.
--- Estamos atrapalhando alguma coisa? --- disse Peter, tentando ver por trás do ombro de Will.
--- Atrapalhando? Não Peet, não, imagine. Eu acabei de sair do banho.
--- E está todo seco? Tá usando shampoo pra cabelos secos, é?
Will tentou esbolçar um sorriso.
--- Haha, não não. Eu me sequei, mas não to conseguindo encontrar meu roupão.
Peter achava aquilo tudo muito estranho.
--- Claro, claro.
--- Estão só de passagem? --- perguntou Will, louco para entrar de volta pra casa.
--- Hã... Não. Quer dizer, sim, na verdade, quer dizer, de passagem? Nãããão, tipo... --- Peter estava se embanando todo. Não podia dizer á Will que estava alí na intenção de saber se ele estava fazendo alguma bobagem. Will já era um homem, não um adolescente.
Christopher enterveio, sabiamente.
--- Na verdade, estamos aqui pra te chamar pra ir na Times amanhã.
--- Isso, exatamente --- reforçou Peter, aliviado.
Will franziu a sobrancelha.
--- Amanhã? eu tenho coisa pra fazer e...
--- O que? Procurar o roupão desaparecido? --- disse Peter, rindo falsamente.
--- Vamos, vai ser legal. Noite da... --- Christopher olhou para Peter, pedindo ajuda.
--- Noite da... ? --- Will franziu a testa.
--- Noite da sapata! Isso, é, noite da sapata. --- Peter concluiu. Foi a primeira coisa que ele pensou.
Will suspirou fundo.
--- Vocês querem que eu passe minha noite de sabado vendo um bando de sapatas se pegando. Isso é sério?
--- É só o tema, você sabe. E os meninos também vão. Colin pergunta por você sempre que me vê.
Os ultimos dias tinham sido tão estranhos para Will que ele nem se lembrava direito de Colin.
--- Tá, eu... Eu vou --- disse ele, esfregando os olhos --- Que horas eu passo na sua casa?
Peter respondeu sem pensar.
--- Ás sete --- Peter olhou para Christopher e disse também --- Ás sete.
Christopher assentiu com a cabeça.
--- Okay, eu apareço. Agora deixa eu ir procurar o roupão.
Peter assentiu e sorriu.
--- Até amanhã! --- disse ele, se virando de volta para o carro.
Will respondeu um "até amanhã", mas não sabia se Peter tinha escutado.
Quando entrou no apartamento, o rapaz de barba para fazer estava deitado na cama, nu, com a cabeça apoiada na mão direita.
--- Seus amigos tem vozes bonitas. Porque não os chamou para fazer parte da nossa brincadeira? --- disse, maliciosamente.
Will jogou o lençol no chão, e sentou de pernas abertas em cima da virilia do rapaz. Esticou o corpo para pegar a garrafa de vodca que estava acima do criado mudo e deu um gole.
--- Eles fazem o tipo de garotos sérios, compromissados. Em outras palavras, não sabem curtir um bom macho.
Ele aproximou o rosto do peito do rapaz e deu um beijo em seu mamilo.
--- E você --- disse o rapaz de barba --- Não faz o estilo garoto certinho?
Will passou a lingua na barriga do rapaz, e riu maliciosamente quando respondeu.
--- Não mais.
sábado, 29 de maio de 2010
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