Novo Começo Não tão Novo.
O sol entrava forte e radiante pelas frestas feitas pela cortina de seda.
Eles já estavam acordados fazia alguns minutos, mas não ousaram quebrar o silencio. Seus dedos estavam entrelaçados; um ouvia os batimentos do coração do outro; eles respiravam no mesmo ritmo.
A casa estava silenciosa.
Peter estava deitado no peito de Luigi, quando este olhou para ele e piscou.
--- O que foi? --- disse Peter.
Luigi sorriu e respondeu.
--- Quer dizer então que agora você está sem emprego?
Um sorriso melancólico apareceu no rosto de Peter.
--- É o que parece. Tenho que ir na ArtDeco para descobrir. Mas você parece feliz com isso.
Luigi deu os ombros.
--- Só acho que agora você vai poder ter o seu proprio escirtório de decoração, como você sempre quis.
Peter abaixou uma sobrancelha e repuxou os lábios para o canto.
--- Eu não tinha pensado dessa forma.
Desde que Peter terminara a faculdade de decoração, sua idéia e vontade sempre foram a de abrir o seu próprio escritório. Mas como qualquer universitário que termina a faculdade, Peter não tinha muito dinheiro e não queria pedir a ajuda do seu pai. Ele começou como estagiário na ArtDeco e assim permaneceu por onze meses. Depois de ser contratado com toda a papelada assinada, ele se tornou um dos melhores decoradores da empresa. Agora, quatro anos depois, a idéia que havia adormecido em sua mente voltou á vida.
Peter sentou-se na cama olhou sugestivamente para Luigi.
--- E você poderia ter a sua propria galeria de arte.
Luigi olhou para ele como se estivesse falando grego.
--- O que? Não Peter --- ele deu uma risada e se ageitou nos travesseiros --- Não é a hora ainda.
--- Porque não? Luigi, pense: Você quer ficar quanto tempo fotografando modelos magricelas e depois ficar retocando suas imperfeições?
--- E você acha que é fácil abrir uma galeria?
--- Bom, facil não deve ser --- Peter pareceu pensar melhor --- Mas era a sua idéia principal quando viemos morar juntos.
Luigi considerou a idéia por um minuto.
--- Não. Ainda não. Quem sabe no proximo ano ...
--- Proximo ano ainda?
--- Peter, estamos á menos de duas semanas no natal. Não vai demorar.
Foi aí que Peter percebeu que a idéia de Luigi ficaria por mais um tempo guardada.
Alguns minutos depois, quando já tinham conversado sobre diversos assuntos, Peter lembrou-se de algo.
--- Então... Você contou para o Will?
Luigi abaixou os olhos como uma criança que era pega fazendo algo errado.
--- Eu... Eu só achei que era o certo a fazer. Eles só ficava se lamentando...
--- Eu sei. Acho que era o certo mesmo, eu devia ter feito isso. Como ele ficou?
Luigi puxou pela memória --- aquilo parecia ter acontecido á tanto tempo atrás.
--- Bom, a vidraça do Archier ficou rachada quando Will bateu a porta. Isso descreve bem?
Peter balançou a cabeça positivamente.
--- Nada melhor do que uma vidraça rachada.
Luigi deu um sorriso e avançou para cima de Peter, fazendo-o deitar na cama.
--- Não vá para longe novamente, por favor? Eu quase pirei sem você aqui.
Peter sorriu e deu-lhe um beijo.
--- Okay, prometo que não faço mais isso.
Luigi deitou a cabeça na barriga de Peter.
--- Okay.
Minutos depois, Peter se levantou da cama e ainda nu foi para o banheiro.
Ele tinha algumas coisas á fazer naquele dia.
Segundos depois ele voltou ao quarto.
--- O que você ainda fazendo aí ainda? --- ele foi até a cama e segurou os pulsos de Luigi --- Eu fiquei quatro semanas fora de casa, e você tem a obrigação de ficar comigo todos os minutos possiveis.
Luigi sorriu e se levantou da cama.
--- Sim, mestre.
Eles se beijaram e foram para debaixo do chuveiro.
Ficaram o resto da manhã lá.
Mick estava terminando de colocar seu laptop dentro da mochila quando ouviu alguem descendo as escadas. Pensou que fosse Luigi, mas descartou a idéia --- o som era de duas pessoas descendo as escadas.
Quando seus olhos focalizaram os cabelos douradas e molhados de Peter, sua reação foi automatica. Ele largou a mochila no sofá e correu em direção ao amigo.
--- Peter! Ah, Peter!
Mick se lançou para os braços de Peter e fechou as pernas em volta dele.
Mick não sabia se chorava ou se ria.
--- Também é bom ver você, Mick --- disse Peter.
Olhando aquela cena, um pensamento antigo passou pela mente de Luigi.
Mick é o Peter quando ele era mais novo. A unica diferença é que Peter não era fútil.
A semelhança entre eles eram muitas; ambos tinham a cor do cabelo bem claro, olhos azuis (Só que os olhos de Peter eram bem mais bonitos do que de Mick) e a pele bem clara. As personalidades eram totalmente diferentes, mas é bem possivel que eles pudessem se passar como irmãos.
Depois de Mick soltar Peter, os três foram para a cozinha.
--- Eu queria ter falado com você ontem --- disse Mick, enquanto eles andavam --- Só que eu imaginei que você estaria muito ocupado --- Mick olhou sugestivamente para Luigi e para Peter.
Luigi sorriu e disse:
--- Tinhamos muitas coisas a tratar.
--- Muitos assuntos para colocar em dia --- Peter acrescentou.
--- E muitas outras coisas para "colocarem" não é mesmo? --- disse Mick, dando uma risada baixa.
Luigi e Peter se olharam como se estivessem conversando por telepatia. A expressão um do outro dizia a resposta para a pergunta.
--- Mick, não usamos mais camisinha á uns dois anos --- disse Peter, se servindo de café.
--- Nem lubrificante --- disse Luigi.
Mick piscou compulsivamente e fez o sinal de "não" com a mão.
--- Chega, é informação demais para mim --- disse ele, sem graça.
Luigi sorriu e olhou ara o relógio. Estava atrasado para o trabalho.
--- Tenho que ir --- disse ele, conferindo se as chaves do carro estavam no seu bolso.
Ele deu um beijo no rosto de Mick e um beijo na boca de Peter.
--- Eu te amo.
--- Também te amo.
Mick só olhava a cena, sem dizer nada.
Luigi saiu da cozinha e segundos depois o som da porta da sala chegou até eles.
Quando finalmente ficaram a sós, Peter queria saber de tudo que Mick tinha aprontado nessas ultimas semanas.
--- Nada demais. Quer dizer, saí com alguns caras, vi o meu professor sair de um darkroon, toneladas de trabalho pra fazer... Você sabe, nada demais.
Peter se fixou em um ponto da frase.
--- Professor sair de darkroon? Que história é essa?
Mick foi até Peter e passou um braço sobre o seu pescoço.
--- Peter, meu amiguinho, você ficou fora tempo demais. Vamos ao Archier, Arthur está com saudades.
--- E o filho pródigo retorna para o lar! --- disse Arthur, enquanto abraçava Peter calorosamente.
Mick estava ligando a maquina de capuccino e preparando três copos para cada um.
--- Quero saber tudo da viagem --- disse Arthur sentando-se atrás do balcão --- Fofocas de navio, quem pegou quem, TUDO!
Peter sorriu e bebeu um gole bem grande do capuccino --- estava com saudades daquelas rodas de conversa com os amigos. Pena que dois estavam faltando.
--- Depois, depois --- disse Peter --- Mas primeiro eu quero saber do que aconteceu por aqui.
Mick e Arthur se entreolharam.
--- Quem começa? --- disse Mick.
--- Você, claro --- disse Arthur.
Mick se arrumou na cadeira e começou a falar.
--- Bom, estava eu lá, na Times, ficando com um cara suuuper gostoso.
--- Que novidade. Quantos centimetros? --- disse Arthur.
--- Cala a boca, sim? Dezessete.
Peter sorriu e bebeu mais capuccino.
--- E eu estava esperando para que algum darkroon ficasse livre, e quando a porta finalmente se abre, meu professor da faculdade saí de lá com um cara! Fiquei pasmo.
--- Ele é bonito? --- disse Peter.
Mick pensou durante alguns instantes.
--- Sim, até que é sim. Mas não tem cara de gay.
--- E o que você vai fazer? --- perguntou Arthur.
--- Bom, se ele não melhorar as minhas notas, vou usar esse acontecimento ao meu favor.
Peter não gostou muito dessa idéia.
--- Você não precisa disso para ter boas notas, Mick --- ele até parecia um pai falando para o filho --- Você tem talento e inteligencia para conseguir notas altas.
--- Você até poderia ser a encarnação da Chanel --- falou Arthur, rindo.
--- Mas ele não me dá notas altas! Sei lá, acho que ele não gosta muito de mim.
--- Ele não deve gostar de gays-louros-passivos-estilistas --- Arthur estava se divertindo com aquilo.
Mick fuzilou Arthur com os olhos.
Peter então se lembrou de um assunto.
--- E você, Arthur? Fiquei sabendo de um tal de Colin...
Arthur passou a mão pelos cabelos e suspirou fundo.
--- Isso mesmo, Colin. O cara mais legal que eu já conheci.
--- Fale-me sobre ele --- pediu Peter.
--- Bom... Eu conheci ele na noite anterior da sua viagem. Para encurtar um pouco a história, eu me apaixonei por um garoto de programa.
--- Um garoto de programa que também se apaixonou por você --- disse Mick.
--- Um garoto de programa que foi embora deixando apenas um pedaço de papel com duas palavras.
Peter pegou na mão de Arthur e puxou o lábio para o canto.
--- Não fique assim, ele pode voltar.
Arthur não parecia acreditar muito nisso.
--- Será? Ele se prostitui para pagar a faculdade. Faculdade de quatro anos de duração.
--- Não tem como você procura-lo? --- Peter queria dar esperança ao amigo.
--- Acho dificil. Sabe como é essa coisa de pontos e tals...
Peter balançou a cabeça e não disse mais nada. Sua mente ficou á deriva durante alguns minutos.
Seus olhos começaram á vagar pela livraria-café, e finalmente se deteram no vidro da vitrine.
Seguindo os olhos de Peter, Arthur adivinhou no que o amigo estava pensando.
--- Luigi pagou outro vidro.
--- Eu sei --- disse Peter, meio ranzinza --- E com o meu cartão de crédito.
Mick sorriu sem humor algum.
--- Acho que eu tenho que falar com ele. Dar alguma explicação.
--- Ele parecia bem furioso quando saiu daqui naquele dia --- disse Arthur --- Dê um tempo para ele. Sabe como é, deixar a raiva passar.
Mick estava olhando para o vidro quando uma forma familiar surgiu em seu campo de visão.
--- Acho que você não tem esse tempo, Pet --- disse Mick.
Quando o sino acima da porta soou, os olhos de Arthur e de Peter seguiram o som.
Deram de cara com Will, parado perto da porta.
Estava num estado deplorável. Seu blazer estava totalmente amassado, e sua calça estava com a barra encostando no chão. Fiapos eram arratados pela calçada, fazendo a barra se desgastar.
O que mais chamou a atenção de Peter foi o olhar de Will para ele. Peter havia pensando que veria dor, furia e muita raiva. Mas não havia nada. Apenas o nada, como se Peter fosse um estranho.
Sem dizer nada e com os olhos fitando aparentemente o vazio, Will saiu do Archier como um raio.
Peter fez o mesmo. Levantou da cadeira e saiu em disparado pela porta.
--- Will, espere! --- disse ele quando visualizou as costas do amigo, á alguns metros longe.
Will nem se virou. Continuou andando praticamente correndo.
Peter apertou o passo e em poucos segundos estava quase nas costas de Will.
O bom de ser alto é que você alcança todo mundo.
Quando estava á centimetros de Will, Peter pegou em seu ombro, com a intenção de para-lo. Não foi bem essa a reação --- Will se virou e gritou com Peter.
--- Não encoste em mim, Calledon!
As pessoas em volta olharam para Will, curiosas.
--- Callendon? Que isso? Você nunca me chama assim!
Will não estava acreditando.
--- Como você ainda tem coragem de vir falar comigo? Você... você é um idiota, sabia!?
Peter cruzou os braços diante do peito, sabia que aquela era uma reação esperada.
Para a surpresa de Peter, os insultos não sairam da boca de Will como Peter esperava. Will apenas se virou e voltou a andar.
--- Will, eu preciso conversar com você!
Will parou no meio do caminho e se virou.
--- Para você é Willian. Will é apenas para os amigos.
Tais palavras fizeram Peter perder o rasciocínio. Quando Will voltou a andar, Peter não fez nada. Ficou parado olhando o amigo se afastar.
Ou seria ex-amigo?
Minutos depois, Peter estava no Archier, segurando uma caneta enquanto um pedaço de papel estava pousado no balcão. Mick já tinha saído para o trabalho e Arthur estava conferindo o preço de um livro.
Peter escreveu qualquer coisa no papel e devolveu a caneta para Arthur.
--- Aonde você vai?
Peter se virou e respondeu para Arthur.
--- No apartamento do Will.
Depois de três insistentes batidas na porta, Will apareceu. Fechou a cara quando viu quem era.
Peter estava lá, com um pedaço de papel nas mãos.
--- Só pode estar de brincadeira --- disse Will, se afastando da porta e deixando-a aberta.
Aquilo era um convite para que Peter entrasse? Não importava --- Peter entrou assim mesmo.
Seguindo pelo hall, Peter se encontrou na grande sala com chão de madeira, mesa de centro e sofás em cores azuis.
Will foi até a janela e se apoiou nela. Não disse uma palavra.
O silencio estava constrangedor. Peter resolver acabar logo com aquilo.
--- Olha, eu sei o que você está sentindo...
Will o interrompeu bruscamente.
--- Sabe? Tem certeza?
Peter baixou a cabeça como uma criança.
--- Tá, eu não sei. Mas eu só queria que você soubesse que eu não fiz por mal.
Will se afastou da janela e olhou para Peter.
--- Você deveria ter me contado.
--- Eu sei, eu sei, mas...
--- Se sabe porque não contou?!
--- Seth! O Seth me pediu!
Will voltou a se afastar.
--- Sai daqui, Peter.
Peter abriu a boca para falar, mas não o fez. Apenas dobrou o papel que tinha nas mãos e colocou em cima da mesa de centro. Depois ele virou as costas e saiu sem fazer barulho.
Parecia que já tinha se passado dias quando Will se virou e notou que estava sózinho. Notou também um pedaço de papel na mesinha de centro. Pegou o papel e o desdobrou.
A letra fina e elegante de Peter mostrava apenas um endereço. Esse endereço ficava perto do centro.
A idéia que passou pela cabeça de Will era absurda. Se Peter tinha escondido dele um segredo, porque iria relevar onde...
Will tomou a decisão. Pegou a chave do carro e saiu de casa.
Luigi estava sentado no sofá, na companhia de uma grande caneca de chocolate quente, quando ouviu a porta de entrada fazer barulho. Quando virou a cabeça, Peter entrava na sala. Parecia que estava chegando de uma guerra.
Peter levantou as sobrancelhas quando viu Luigi sentado no sofá.
--- Acho que alguem está precisando de chocolate quente. Ainda tem na panela que está no fogão.
--- Não precisa, eu bebo do seu --- disse Peter, pegando a caneca das mãos de Luigi e sentando-se ao seu lado.
Então tá, pensou Luigi.
Peter deu um grande gole e devolveu a caneca para Luigi.
--- Mas que bonitinho --- disse Luigi, olhando para dentro da caneca --- Ele deixou um pouquinho para mim. Merece o premio Nobel.
Peter sorriu ironicamente e respondeu para Luigi.
--- Chato.
Luigi sorriu e passou os braços envolta de Peter, puxando-o para si.
--- E aí, como foi seu dia? --- Luigi quis saber.
--- Eu e você fizemos amor, depois eu vi os meninos, e Will não quer mais falar comigo, pelo menos por enquanto.
--- Você foi falar com ele?
--- Eu encontrei com ele no Archier. Quando ele me viu, saiu praticamente correndo. Depois eu fui até o apartamento dele e dei o endereço do Seth.
Luigi pensou por alguns instantes.
--- E você deu o endereço do Seth na esperança de que o Will entenda o gesto como um pedido de desculpas?
Peter não tinha pensado dessa forma, mas estava com preguissa de explicar.
--- Se der certo, okay.
Luigi sorriu e o abraçou ainda mais.
Enquanto estava perdido em pensamentos, Peter sentiu um solavanco e depois viu Luigi ir para a cozinha.
--- Você quer mais chocolate? --- gritou Luigi da cozinha.
Fui trocado por uma caneca de chocolate. Não estou valendo mais nada, pensou Peter.
Luigi apareceu na sala segurando a panela com o chocolate.
--- Dá pra dividir --- disse ele sorrindo.
Peter pulou do sofá e foi para a cozinha.
Quando eles terminaram de beber o chocolate, tomaram banhos juntos e dormiram tranquilamente.