O Convite.
O numero que era mostrado no identificador de chamadas já era muito conhecido á Peter. Não que ele ligasse muito para aquele numero, pois na verdade fazia quase cinco anos que deixara de ligar para o tal numero.
O identificador de chamadas havia registrado quatro chamadas do mesmo numero. Cada uma delas com um intervalo de cinco á dez minutos.
Peter não queria atender. Sabia quem era, sabia o que queria, e principalmente, sabia como iria ser tratado.
Nada de palavras doces ou gentis, muito menos agradáveis.
Carmen Cortez Willer. Casada com Giulliano Willer.
Pais do seu bem mais precioso e mais amado.
Esses eram os nomes dos pais de Luigi.
A relação de Peter com os pais de Luigi nunca foi a mais amistosa do mundo. Muito pelo contrário. Carmen sempre acusava Peter de ter levado para longe seu único filho homem.
Mas o pai de Luigi, Giulliano Willer, sempre viu Peter com bons olhos.
Giulliano entendia a situação. Tendo um filho gay, que tinha grande admiração por fotografia e tratamento de imagens, uma cidade grande continha muito mais oportunidades do que uma cidadezinha inócua e totalmente desatualizada. Giulliano sempre seria grato ao jovem de olhos azuis que mostrara ao seu filho um mundo de oportunidades e novos conhecimentos.
Mas Carmen nunca veria Peter desta forma. Para ela, Peter sempre seria a pedra em seu sapato. A gárgula que levara seu filho á uma cidade cheia de ganância e pessoas mal-intencionadas.
O telefone começou á tocar novamente. Peter, que estava no meio de uma pilha de mostruários de tecido e cores, olhou novamente para o aparelho que tirara sua concentração.
Suspirando e se levantando, Peter foi até a mesa e atendeu ao telefone.
•••
Olhosverdes22 diz:
Eu faria tudo com você!
Justonenight diz:
Estou só esperando, venha agora.
Olhosverdes22 diz:
Mas quero que você use uma coisa...
Justonenight diz:
O que?
Olhosverdes22 diz:
Sapato de bico fino.
Depois desse estranho pedido, Arthur localizou o botão “bloquear” que se encontrava na parte superior da janela de conversa e clicou.
Porque caras que gostam de mulher pedem para fazer sexo com outro homem, usando objetos de mulher? Pensou, Não que eu não fique bem de salto alto, mas...
Será que eram todos homens feios, que como não conseguiam garotas bonitas para transar, apelavam para gays loucos por sexo?
Arthur não soube responder.
Era uma calma e fria tarde na sua livraria-café, chamada de Archier. O nome da livraria-café vinha de uma homenagem ao brasão de sua família, um arqueiro mirando seu próximo alvo.
Arthur gostava de trabalhar ali. Mesmo tendo cursado faculdade de psicologia e historia da arte, ele nunca se sentiu atraído realmente por tais áreas.
A faculdade foi um acordo que fizera com seu pai. Arthur faria o curso, e seu pai pagaria. No fim do curso, Arthur receberia o dobro do valor que seu pai gastou com sua educação universitária.
No fim dos dois cursos, Arthur já tinha dinheiro suficiente para abrir seu próprio negócio.
As idéias vieram como a chuva. Pensara em abrir uma boate noturna, uma casa de antiguidades, uma lanchonete... Mas ficara mesmo com a livraria-café. Gostava do ambiente que havia criado. Pessoas cultas, refinadas, carregando laptops ou outros aparelhos eletrônicos sempre paravam por lá para beber um capuccino ou comprar livros.
Com o dinheiro que ganhava ali, conseguia muito bem manter uma casa, suprir necessidades e ainda comprar mais livros para a livraria.
Arthur se considerava como alguém que tinha uma boa vida. Um negócio próspero, amigos maravilhosos, sua família dava total apoio á ele e ainda tinha uma casa legal.
Mas lhe faltava algo. Ou alguém.
Em matéria de amor e relacionamentos, Arthur não era exatamente um expert. Tivera alguns relacionamentos, mas que nunca o levaram á lugar algum.
Mas não tinha pressa. Estava com 28 anos, tinha um corpo legal e uma personalidade melhor ainda.
Avaliando suas “recentes” experiências sexuais, concluiu que fazia meses que não dormia com alguém. Ele nunca foi um ninfomaníaco nem nada parecido, mas as vezes, enquanto o sono não vem, o espaço vazio do outro lado da cama o incomodava.
Olhando para o contato que havia acabado de bloquear, abriu novamente a caixa de conversa e clicou em “desbloquear”
Digitou uma mensagem e mandou.
Justonenight diz:
Oi, desculpe, tive que sair. Gosta de sapatos pretos ou vermelhos?
•••
A voz do outro lado da linha não havia mudado em nada. Muito menos na aspereza.
--- Quero falar com meu filho. Onde ele está? Por que não atendeu ao telefone?
Suspirou. Contou até 100.
--- Olá, Carmen, desculpe a demora.
--- Olá. Onde está o Lui?
--- Trabalhando. Posso fazer algo pela senhora? Aliás, estou ótimo, obrigado por perguntar.
Peter sabia que sarcasmo não funcionava muito com a família Willer.
--- Poderia ter feito, á cinco anos atrás. Mas não liguei para falar isso. Muito menos para falar com você.
--- Estou acostumado com tanta hospitalidade. Mas como venho de excelente educação, irei perguntar novamente. Posso fazer algo?
--- Sim, pode --- resmungou a mulher do outro lado da linha --- Na próxima semana eu e Giulliano iremos fazer 40 anos de casados. E, é claro, Luigi tem que estar aqui.
--- Darei o recado, mas acho que ele estará ocupado.
--- Ocupado? Com o que?
Certas perguntas merecem certas repostas...
--- Bom, algo que ele faz 5 dias por semana. Também conhecido como emprego.
--- Claro --- riu ela --- Algo que você não faz. Por que se fizesse, não estaria em casa, no meio da tarde.
--- Esse é o bom de trabalhar em uma empresa que mantém mais de 120 funcionarios. Podemos nos dar ao luxo de trabalhar poucos dias por semana.
--- Se escolher almofadas e brincar de desenhar sofás ou estantes é considerado trabalho...
Carmen havia tocado na ferida de Peter, que sempre se irritava quando alguém ligava decoração á apenas tecidos e almofadas. Certa vez, um comentário de Luigi fez Peter iginora-lo por uma semana.
Aquela era uma batalha perdida, e Peter sabia disso. Mas o que consolava era que Peter tinha ganhado a batalha. Tinha conseguido fazer Luigi sair de uma cidade pequena, onde seu talento não seria explorado totalmente, e o levado a uma cidade onde os convites para fotografar chegavam aos montes.
--- Eu digo que você ligou, e mando o recado.
--- Ótimo. E diga á ele também que é uma ocasião de família. Apenas de família.
--- Por que não diz logo á mim? Sei que está dizendo a mim para não ir.
--- Como preferir. Não venha. É uma ocasião de família. E você não faz parte da minha família.
O punho de Peter se começava a se fechar.
--- Engraçado. Eu transo com seu filho á mais de 4 anos. Ele usa uma aliança com o nome Peter gravado. Agora eu pergunto quem não faz parte de qual família?
Peter não obteve resposta. O som que se seguiu era o de um telefone sendo desligado.
Quinze minutos depois, o mesmo numero voltara a aparecer no identificador de chamadas. Mesmo sem saber o porquê, Peter atendeu.
--- O que quer?
A voz do outro lado da linha vinha carregada de sinceridade e bondade.
--- Que você e meu filho venham á minha festa de casamento. Fazem parte desta família. E eu havia me esquecido que já faz quase cinco anos que vocês estão juntos.
Giulliano Willer. Desde o começo, Peter sempre foi muito bem recebido por aquele italiano de olhos bondosos e cabelos que começavam a ficar grisalhos.
--- Giulliano? Oi, me desculpe, pensei que fosse...
--- Tudo bem, filho, tudo bem. Pensei que nem fosse atender ao telefone.
--- Nem sei como atendi. Como o senhor está?
--- Senhor?
Giulliano nunca permitiu que Peter o chamasse de “senhor”. E sempre que isso acontecia, Peter era corrigido.
--- Você. Como você está?
--- Sabe como é, nunca pergunte a um velho como ele está, pois a resposta nunca terá fim.
Peter riu com o comentário. Adorava Giulliano, e não conseguia entender o porquê de ele estar casado com Carmen.
--- Mas muito bem, Peter, não é para falar de velhice que estou ligando. Estou ligando porque quero a sua presença aqui, junto com Luigi.
Como dizer não á um homem tão educado, sem parecer deselegante?
--- Giulliano, não acho que seja boa idéia. Aquela conversa que tive com Carmen a uns minutos atrás... Não foi exatamente as melhores.
--- Ela me contou. Ficou horrorizada quando você disse que transava com Luigi a mais de quatro anos.
Escolha melhor as palavras, sua anta! Pensou Peter.
--- Desculpe se exagerei. Mas é que as vezes ...
--- É difícil agüentar, eu sei. Mas olhe, eu lhe prometo, se você vier, não haverá dor de cabeça.
--- Não sei, Giulliano. Vou conversar com o Luigi.
--- Faça isso, filho --- respondeu o italiano --- Mas venha. Seria muito bom para mim. Estou com saudade de vocês dois.
--- Também sentimos sua falta. É que estamos meio ocupados no momento.
--- Estou sabendo. Luigi me contou sobre o Queen Mary 2. Vai aceitar o trabalho?
Peter não sabia. Estava meio relutante quanto a isso.
--- Não sei ainda, tenho que pensar. Tenho duas semanas para assinar o contrato ou não.
--- Devia ir. Fiquei sabendo que é um navio maravilhoso. Quanto tempo ficaria lá?
--- 3 semanas. Se não mais que isso.
--- Devia ir. Muito bem filho, converse com Luigi, e espero encontra-lo aqui no dia da festa.
--- Se não der para eu ir, mandarei um presente.
--- Não se incomode. Na verdade, se incomode sim, adoro ganhar presentes.
Sempre o humor de sempre, pensou Peter.
--- Mandarei.
--- Certo, filho. Mande noticias suas e de Luigi.
Quando desligou o telefone, Peter estava quase convencido a ir. Sentia saudades de Giulliano. Talvez o único parente de Luigi que o tratasse bem, ou sem falsidade.
Quando voltou para as amostras de cores, Peter ouviu a porta da garagem se abrir, e um carro deslizando para dentro.
Luigi chegara.
Mick estava indeciso sobre a questão de vestir uma modelo com cintura de 37 cm com um vestido azul ou uma calça estilo Saruel.
Não queria ser indelicado, mas nada ficava bem naquela modelo. Era seca igual um graveto, com os ossos do colo visivelmente á mostra. Ainda se perguntava porque a agencia contratou aquela garota.
Mick trabalhava na agencia de modelos FordModels, e seu trabalho era de consultoria. Ele era chamado para escolher quais roupas caiam melhor em cada modelo, criar combinações e até mesmo desenhar algumas peças. Com esse emprego, Mick pagava a faculdade de Moda e conseguia ser um pouco independente.
Apenas um pouco.
Quase toda a grana que recebia com as consultorias ia para pagar as mensalidades, o que fazia com que ainda morasse na casa dos pais.
Fora a faculdade, Mick ainda tinha que pagar o material usado em sala de aula, livros importados caríssimos, e seus gostos e presentes que dava a ele mesmo.
Quando não estava trabalhando, Mick se divertia á noite na Times. Mas nunca ficava a noite inteira lá.
A Times abria às onze horas, mas as pessoas só chegavam depois da uma da manhã. O máximo de hora que Mick ficava lá era até as duas. Depois desse horário, ia para casa de algum garoto musculoso que tivesse a fim de transar.
Ou nem para casa. Poderia ser motel, beco que havia atrás da Times, ou até mesmo algum banheiro publico. Isso não importava muito para ele. Tendo lubrificante a base de água e preservativos, o local onde ia transar não importava muito.
E mesmo tendo uma vida sexual totalmente ativa (no sentido de fazer muito sexo, mas não que seja ativo na transa. Mick era uma passiva incurável.) As preferências e orientações de Mick ainda eram um segredo para sua família.
Tinha apenas 19 anos. Fazia alguns meses que começou a faculdade. Morava com os pais. Não tinha como dizer aos pais que era gay e ainda assim continuar morando com eles.
O pai de Mick, o senhor Nicollas Bernal, era um juiz que faturava quase 85 milhões por ano. Quando tinha 18 anos, passou dois anos no exercito, para depois fazer a faculdade de direito. Terminado a faculdade, passou para a defensoria publica, para depois á promotoria. Anos depois na promotoria, virou juiz e pretende se aposentar dentro de três anos.
Quando estava no exercito, gostava de ser um soldado. Queria seguir carreira, lutar pelo seu país e tudo que teria direito. Antes, nunca havia passado pela sua cabeça fazer faculdade de direito.
Mas, um dia como os outros, enquanto estava em seu horário de descanso, notou olhares estranhos vindo de seu superior. Sempre notara que era tratado de melhor maneira pelo seu superior, e nunca se incomodava com isso. Mas depois de uns tempos, começou a perceber olhares insinuosos e lascivos vindos de seu superior.
Um dia, quando estava sozinho no banho, seu superior entrou e acabara com a carreira militar de Nicollas antes mesmo de começar.
Sem se intimidar, tirou toda a roupa e se dirigiu até Nicollas, que fingia não estar vendo nada.
Quando deu por si, Nicollas estava encurralado contra a parede, enquanto o homem fazia movimentos circulares com a cintura.
Nicollas viu seu corpo ser violado sem dó nem piedade por um homem que sempre respeitara. Durante anos, não conseguiu esquecer aquela tarde tão vergonhosa que nunca conseguira contar a ninguém.
Dois dias depois, pediu para ser mandado para casa. Não conseguia mais ficar ali.
Anos depois, mesmo tendo casado e tido um casal de filhos gêmeos, Michelangelo e Elisangela, seu ódio por homens que gostavam de outros homens crescia a cada dia.
--- Quer saber? Nenhum dos dois fica bom em você, querida. Quem contratou você para trabalhar aqui? Cruella Devil?
A modelo saiu correndo da sala, indo chorar sozinha no banheiro da FordModel.
•••
--- Se o meu pai te convidou, você tem que ir!
--- Não, não tenho não. Você é obrigado a ir, eu posso escolher entre ir ou ficar.
Fazia 30 minutos que Peter e Luigi estavam tendo essa conversa e ainda não tinham chegado a lugar algum.
--- Ele vai ficar chateado se você não ficar.
--- E sua mãe vai jogar álcool em mim e depois um palito de fósforo aceso --- rebateu Peter.
--- Eu não vou deixar. É só você ficar perto de mim a noite inteira.
--- Claro. Aí eu terei que agüentar indiretas super diretas e olhares fuziladores.
Peter estava de costas para Luigi, terminando de lavar a louça, quando sentiu os braços do outro envolver sua cintura. O queixo de Luigi fikou apoiado sobre o ombro de Peter.
--- Por mim --- disse ele.
Peter suspirou.
--- Isso é golpe baixo.
--- O que é golpe baixo?
--- Sabe que eu nunca digo não á você.
--- Eu sei.
--- E não se sente nada mal por usar o meu amor e carinho por você só para conseguir o que quer?
Peter se virou e lançou seus braços no pescoço de Luigi, ficando a centímetros do seu rosto, com peito, barriga e cintura colados um ao outro.
--- Na verdade, não.
Ele sorriu diante da sinceridade e cara-de-pau de Luigi. Aproximou-se dos lábios dele e lhe deu um beijo longo e apaixonado.
Quando seus lábios se afastaram, Peter afastou o rosto para poder olhar melhor para Luigi.
--- Eu te amo. Não tenha duvidas disso. Mas sabe o que está me pedindo para fazer? É como se eu pedisse á você para entrar em uma jaula com um leão dentro.
--- Mas minha mãe não é um leão.
--- Está quase se transformando em um.
--- Não está não, os cabelos dela agora estão vermelhos.
Eles riram diante a comparação.
--- Okay. Então um javali.
--- Javali não é vermelho.
--- Nunca assistiu O Rei Leão? O Pumba é vermelho.
Eles continuaram as comparações durante uns 2 minutos. Nesse meio tempo, Carmen Cortez Willer virou o Pumba, a Satine do musical Moulin Rouge, a Jean Gray do X-Men e até mesmo Julie Cooper do The OC.
--- Falando sério --- disse Peter --- Teríamos que dormir lá?
--- Eu acho melhor do que dirigir a noite inteira.
--- Nada que um bom café não resolva.
--- Viciado. E além do mais, meu pai não permitiria. Ele ia insistir para que dormíssemos lá.
--- Como se sua mãe fosse deixar-nos sozinho em um cômodo.
--- Ela não tem que deixar nada. Eu te amo, e deixar nós separados por uma parede não vai fazer diferença alguma.
Peter ficou em silencio, pensativo.
Luigi já sabia qual seria a resposta.
--- Qual o traje? Social clássico ou gay-gostoso-super sensual?
--- Para a festa --- disse Luigi --- Social clássico. Mas aqui, lá em cima no nosso quarto, o gay-gostoso-super sensual ficaria melhor.
--- Ah é? --- Peter chegou mais perto do rosto de Luigi --- Tenho uma idéia melhor. Lá em cima, no nosso quarto, sem traje algum.
Enquanto se beijavam e iam à direção ao quarto, no segundo andar, um ia tirando a roupa do outro.
Quando chegaram a cama, já estavam completamente nus.
domingo, 11 de outubro de 2009
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