Conversas.
--- E então --- começou Luigi --- O que andam feito?
Cada garoto tinha histórias diferentes para contar. Mick foi o primeiro.
--- Quase fui despedido da FordModel. Quase ninguém lá gosta de sinceridade.
--- O que você fez? --- quis saber Peter.
--- Só disse a uma modelo que ela não servia pra carreira.
--- Pensei que você fosse consultor de moda, não consultor de carreiras --- Falou Will, enquanto se servia de mais um pão-de-queijo.
--- Mas porque você fez isso? --- perguntou Arthur.
--- Porque simplesmente nada servia naquela modelo. Era algo como tentar deixar um esfregão de chão visualmente bonito. Não dá, simplesmente não dá.
--- E você não agüentou e se abriu para a modelo --- Argumentou Peter.
--- Claro. Ela devia estar acostumada, por que o...
--- Porque o mundo da moda é altamente concorrido e ter beleza é tudo.
Todos na mesa disseram a mesma frase, ao mesmo tempo. Tal frase já fora dita muitas vezes por Mick.
--- Só isso? --- perguntou Will --- só magoou as pessoas e acabou com seus sonhos e planos?
--- Claro que não --- respondeu --- Fui à Times sábado passado. Saí de lá com um descendente de francês insaciável.
--- Ual. Sexo, sonhos destruídos. Esse sim sabe aproveitar a vida.
Enquanto zombava de Mick, Luigi elevou um copo de café.
--- E você? O que anda fazendo? --- E avaliando melhor a pergunta, decidiu refaze-la --- O que vocês andam fazendo?
Peter e Luigi se entreolharam sem saber o que dizer. Eles eram altamente discretos, nunca deixando margens de duvidas sobre a vida pessoal deles.
Foi Luigi quem respondeu.
--- Vamos à festa de casamento dos meus pais na semana que vem.
--- Ihh --- Arthur fez cara de assustado ao falar --- Peter e a senhora Willer no mesmo ambiente? Vamos ter um funeral á ir.
--- Só resta saber se quem será velado vai ser o loiro aí --- Will apontou para Peter --- Ou a mãe do espanhol aí --- terminou a frase apontando para Luigi.
--- Italiano --- respondeu Luigi, seco --- E não haverá funeral algum. Minha mãe deve estar mais tolerável com o Peter.
Todos na mesa encararam Luigi como se este tivesse dito algo completamente absurdo.
--- Ta bom, ta bom. Nem tanto assim. Mas é só uma comemoração.
--- Ta, chega --- interrompeu Mick --- Fale sobre coisas interessantes. Vocês vão fazer sexo no seu antigo quarto?
A pergunta os pegou de surpresa.
--- Talvez. Quem sabe?
--- Até parece que eles nos diriam --- Disse Arthur.
Arthur, Will e Mick riram com o comentário.
Sem entender aonde a conversa estava indo parar, Peter e Luigi ficaram calados, sem entender.
--- Ah, parem com isso --- começou Mick --- ta bom que vocês estão juntos á uns 200 anos e não revelam a intimidade de vocês. Mas vocês não se cansam da mesmice?
As sobrancelhas de Peter e Luigi se levantaram.
--- Quatro anos e nove meses --- corrigiu Luigi.
--- E se mesmice você quer dizer ir dormir e acordar ao lado da pessoa que você ama, não nos cansamos ainda.
--- Mas e a rotina --- insistiu Mick --- não cansaram dela?
--- Mas que rotina? --- Luigi se curvava sobre a mesa, em direção á Mick.
--- A rotina, ué. Você trabalha cinco dias por semana. Peter trabalha três. Você deve chegar em casa e encontra-la toda arrumada, com sua mulher sentada no sofá toda perfumada e cheia de amor para dar. Vocês não cansam mesmo disso?
Luigi não acreditava no que ouvia. Peter apenas prestava atenção ao rosto de Luigi.
Milhares de respostas vieram á mente de Luigi. Mas por amor á Peter, não verbalizou nenhuma delas.
--- Não, não estamos cansados. Muito pelo contrário, estamos cada vez mais felizes com o que temos.
--- Um ao outro --- disse Peter, sorrindo.
--- E uma casa maravilhosa, com piscina e hidromassagem.
Arthur olhava admirado para Peter e Luigi. Eram tão novos, mas tão certos do que queriam. Peter e Luigi eram o centro do universo, para ele.
--- Qual o segredo de vocês, heim? --- Quis saber Arthur.
--- Segredo? --- foi Peter que respondeu --- Não há segredos. Quer dizer, sabemos o que queremos. Estamos tentando fazer dar certo.
--- E estamos conseguindo --- disse Luigi, beijando o pescoço de Peter e entrelaçando-lhe os dedos dele aos seus.
Quanta bobagem, pensou Mick.
--- Mas vamos tentar transar no meu quarto, sim --- disse Luigi.
--- Se não conseguimos no quarto --- brincou Peter --- Pelo menos um boquete no banheiro da festa.
--- Gostei de ver --- disse Will, levantando o copo de chá-gelado.
--- E você, Arthur --- quis saber Mick --- Lendo muitos livros ultimamente? Como a divida externa do nosso país está? Nicole Kidman está filmando algo novo?
--- Não faço a mínima idéia --- respondeu Arthur, sem se intimidar --- Mas fiz uma descoberta interessante.
--- Qual? Descobriu que a Cheer não come nada desde os anos oitenta?
Mick ria diante as piadas.
Peter, Luigi e Will apenas olhavam.
--- Não --- disse Arthur--- Descobri que fico muito bem de sapato de bico fino vermelho.
Todos ficaram sérios diante á frase.
--- Virou drag-queen? --- perguntou Peter.
--- Fez operação e virou mulher? --- Luigi quis saber.
--- Voltou a morar com sua mãe? --- Perguntou Will, certo que tinha acertado.
Mas Arthur estava com um sorriso presunçoso no rosto.
--- Nada disso. Saí com um cara esses dias, e ele pediu para que eu usasse sapato de bico fino vermelho.
--- Aonde conheceu esse cara?
Peter não acreditava no que ouvia. Se Mick estivesse dizendo aquilo, tudo bem. Mas Arthur?
--- Internet.
--- E como foi? --- Luigi perguntou, pasmo.
--- Ótimo. Eu não sabia que transar sentado em uma cadeira era tão bom. E em cima da pia da cozinha também.
--- Era grande?
Mick sempre era obcecado pelo tamanho. Para ele, importava ter pinto grande.
---
Os outros garotos olhavam para Arthur com profunda estranheza.
Encontros pela internet? Sapatos de bico fino? Transar na cozinha? Tudo na boca? Arthur não era assim. Arthur era sempre profundo em suas relações, nunca transando com qualquer um ou em qualquer lugar.
--- Eu também estive com um cara recentemente --- revelou Will.
--- E ele pediu que você usasse meia fina tipo arrastão? --- Zombou Mick.
--- Aonde você o conheceu? --- Luigi e Peter perguntaram quase ao mesmo tempo.
--- Ele é novo lá no escritório de advocacia.
--- Conta tudo, menine --- brincou Arthur, enquanto se servia de mais um pão-de-queijo.
--- Não há muita coisa a contar. Era fim de expediente, o escritório estava vazio, só eu e ele lá. Conversamos durante um tempo, e fomos para um barzinho que tem na esquina. Meia hora depois estávamos na minha casa, transando loucamente no sofá.
--- Nunca mais me chame para ver filme na sua casa --- Mick falou.
--- Mas depois fomos para o quarto. Depois para o chuveiro.
--- Todo mundo transando loucamente nesse dias, viva.
Peter ergueu seu copo de capuccino, oferecendo um brinde aos amigos.
Os outros levantaram seus respectivos copos e brindaram junto.
--- Mas teve uma coisa... --- interrompeu Will.
Todos olharam, curiosos.
--- Quando eu acordei...
Will parecia meio constrangido ao falar.
--- Fala logo, bii! --- Mick estava no ápice da curiosidade.
--- Quando eu acordei, ele estava... Lambendo meu dedão do pé. E se masturbando.
Todos se olharam, como se não soubessem o que dizer.
--- Um tarado por pés. Normal --- Peter disse.
--- Pode até ser normal, mas se masturbar lambendo um dedão? Digo, há tantas coisas melhores para se colocar na boca --- Arthur parecia meio indignado.
--- E maiores --- rebateu Mick.
--- E com certeza, mais deliciosas --- riu Peter.
--- Mas o importante é que foi ótimo --- disse Will, fazendo as piadinhas e comentários cessar.
--- E vai vê-lo novamente? --- quis saber Arthur.
--- Ele pegou meu numero. Se vai ligar, eu não sei.
--- Sempre assim --- disse Peter --- quando eu era solteiro, passei meu numero á vários caras que conheci. Nunca ligaram, nem mesmo uma mensagem de texto.
--- Pensei que seu único homem tivesse sido o Luigi --- disse Mick, abaixando uma sobrancelha.
--- Tive outros namorados. Tive até uma namorada.
--- E porque terminaram? --- Will quis saber.
--- Porque ela queria ter apenas um filho. E eu queria transar com homens. Prefiro dizer que acabamos por divergências de interesse.
O grupo riu diante o comentário.
--- Você sabia disso, Luigi?
--- Sim, sabia. Quem aqui nunca ficou com garotas?
Will, Mick e Arthur olharam para o casal significamente.
--- Nunca?
Os três balançaram a cabeça negativamente.
--- São umas bichinhas mesmo.
Uma chuva de pães-de-queijo voou em direção ao casal.
--- Que vão fazer no dia de aniversário de vocês? --- Will perguntou.
--- Ainda não sabemos. Talvez alguma coisa só entre nós --- Peter respondeu.
--- Ou seja --- disse Mick --- Muito sexo.
--- Você só pensa em sexo, garoto? --- Luigi estava cansado dos comentários de Mick. Na verdade, nunca fora grande fã de Mick, mas tratava-o com educação.
--- Não. Também penso em moda e calorias. Ninguém quer transar com alguém gordo que não saiba a diferença entre skini ou boca de sino.
--- Que uma é horrível e a outra é apertada demais? Todos sabem disso --- Will zombou.
--- Hahaha.
Já eram quase dez horas da noite, quando deram por si.
--- Vamos pra casa, amor? Estou cansado.
--- Vamos --- respondeu Luigi.
Arthur se levantou e começou a guardar a louça que havia sujado. Jogou tudo na maquina de lavar.
--- Pode me dar carona? --- Pediu Mick.
--- De boa.
Eles estavam andando na rua, em direção ao carro prata de Peter, estacionado á algumas ruas ao lado.
Luigi, Mick e Arthur seguiam atrás.
Peter se virou para Will e perguntou:
--- Quer que eu o deixe em casa, querido?
--- Não Peter, não precisa.
--- Não vai pra casa?
--- Não.
Peter ficou sem entendeu por um instante. Will estava mesmo diferente. Sem saber porque, lembrou-se de algo.
--- Seth me ligou esses dias.
Mas a frase não causou o efeito desejado. Pensava que Will faria mil perguntas, mas isso não aconteceu.
--- Hum.
--- Ele perguntou de você.
--- O que você respondeu?
--- Que estava bem.
--- Fez certo. Estou ótimo.
Peter estava conseguindo conduzir a conversa bem aonde queria que chegasse.
--- Realmente, está ótimo. Quando vai me contar?
--- Contar o que?
--- O que está havendo.
Will parou, sem entender a pergunta. Pediu explicações.
--- Bem, transas com colegas de trabalho, palavras novas no seu vocabulário. Você está mudado.
--- Talvez já estivesse na hora.
Peter percebeu a irritação na voz do amigo, e se calou. Ele estaria pronto para falar, quando chegasse a hora.
27 segundos e alguns passos a frente foram suficientes.
--- É que nem todos podem ter esse lance de Peter/Luigi. Eu pelo menos não posso ter um lance desses.
Tal assunto sempre incomodava Peter. Ser visto como um casal modelo.
Ele segurou os ombros do amigo enquanto andavam.
--- Tudo bem. Faça tudo que faça você ficar feliz. Isso que importa.
--- Obrigado. E sabe o que é? Estou cansado! Cansado de pensar no Seth, cansado de dormir sozinho, á noite.
--- E prefere dormir com estranhos?
Will olhou para Peter como se não tivesse entendido.
--- Não use esse tom comigo, por favor.
--- Que tom?
--- Esse tom acusador, como se eu tivesse feito algo errado.
Peter se aproximou do amigo e segurou seu rosto.
--- Eu não disse nada. Eu não estou dizendo nada sobre o que é certo errado. Só não quero que nada grave aconteça á você.
--- Sei me cuidar.
--- Sei disso. Por isso não estou preocupado.
Quando chegaram ao carro prata, só alguns segundos foram suficiente para que o resto do grupo os alcançasse.
Mick foi de carona com Luigi e Peter. Will foi a pé para algum lugar que não queria dizer onde ficava, e Arthur foi á pé para casa, que ficava a uns quarteirões dali.
O silencio no carro era estranho. Peter olhava para fora do carro, pensativo.
--- Um beijo pelo seus pensamentos --- Luigi interrompeu.
Peter se virou para ele e disse:
--- Acha que caímos na rotina?
Luigi pensou não ter ouvido direito?
--- O que? Não, claro que não! Não me diga que está dando ouvidos ao que Mick disse?
--- Não é isso. É que... Ele estava certo. Fazemos tudo àquilo que ele disse.
--- Ele diz aquilo porque ele leva uma vida louca de um universitário de 19 anos. Ele não tem a nossa idade, e muito menos a nossa mentalidade. Ele é um garotão.
--- Ou uma garotinha.
O clima dentro do carro ficou mais leve.
--- E quer saber? --- disse Luigi --- Gosto disso. Da nossa vida. Gosto de acordar, tirar fotos de estranhos, voltar para casa e ver você lá. Gosto da segurança disso.
--- Segurança?
--- É, segurança. Não me preocupo pensando que um dia você não estará mais lá. Ou que um dia passaremos qualquer tipo de necessidade. Temos uma vida perfeita. Dividimos algo que poucas pessoas têm. E que muitas invejam.
Peter sorria, com a cabeça encostada no banco.
--- Mas que belo discurso, moço. Minhas pernas estão até bambas de tanta emoção.
Luigi sorriu e tocou o rosto de Peter com a mão. O toque fez com que Peter fechasse os olhos, e sentisse a maciez da mão de Luigi.
--- Eu te amo.
Peter abriu os olhos e respondeu.
--- Eu também te amo.
Foram para casa, tomaram banho juntos e dormiram abraçados. Não fizeram sexo, não precisavam daquilo naquela noite. Apenas a presença um do outro era suficiente para deixá-los satisfeitos.
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